4 de março de 2002
Você é idiota?

Esses caras devem pensar que eu sou idiota... Não sou. A mim ofende que digam em letras garrafais que Roseana Collor tem 26% do eleitorado depois de ouvir, fala sério!, "3.857 pessoas em 153 municipios". Dá uma média de 25 pessoas por muncipio! É piada!

Digamos que tenha havido até alguma proporcionalidade nessa divisão...  Não terão sido menos de dez por muncípio, nem mais de quarenta. Quantos eleitores tem o Rio? E o Brasil? Milhões! Milhões de cariocas representados por quarenta pessoas. Qual pode ser a relevância intelectual, científica, estatística mesmo de uma pesquisa dessas?

O que eu quero dizer é que isso, esse tipo de pesquisa, é um despautério intelectual, um absurdo matemático, uma burrice, uma fantasia estatística sem qualquer valor de verdade - inclusive de verdade estatítica. Ninguém dotado de cérebro pode dar o mais ínfimo crédito a uma maluquice dessas.

Dar crédito a isso é dar prova de estupidez ou falta de caráter. Explico: ou o sujeito publica, divulga, repete uma tolice dessas porque é burro ou porque está comprometido em passar essa mentira pra frente.

É preciso acabar de vez com esse "enfeitiçamento das pequisas" e o único modo realmente eficaz é este: a total desqualificação intelectual de quem as produz e de quem as divulga. E se estabelecer um princípio: jornalismo se faz com fatos. E pesquisa não é fato, é hipótese. Não tem matéria que comece com "Se...".

Pesquisa conta hoje a opinião de alguém ontem sobre algo que aconteceu anteontem. Todos os repórteres e redatores do Brasil tiveram aulinhas didáticas com idiotas funcionais do idioma explicando que exatamente por isso dizer "se a eleição fosse hoje..." é, a rigor, uma mentira ou, para ser mais delicado, inadequada licença poética.

O problema é que, dito do modo verdadeiro, perderia a graça. Imagine o boneco da TV dizendo, cheio de emoção: "Se a eleição tivesse sido há um mês, entre os dias 20 e 21 de janeiro...". Não dá matéria... Então, se divulga a licença poética... Isso sim é reality show.

Aliás, pensando bem, um mês para tabular uma pesquisa tão chinfrim, com apenas 3.857 pessoas? E isso nem é o mais suspeito. Vale a pena ler o relatório da pesquisa disponível no site do DataFolha. É uma uma peça humorística. Quatro páginas discorrendo sobre nada e mais uma "exposição metodológica" que só não diz o principal: afinal, o que eles perguntaram? "Em quem você votaria?" ou "Quem você acha que ganharia?". Não é firula.

Eu, por exemplo, hoje, anularia meu voto. Mas, pelo que desde já está visto, acho que a Roseana Collor ganha. O passaporte está pronto. Se é pra ser governado pelo Maranhão, melhor morar em Lisboa. E digo mais: a pergunta é o de menos...

O que eu quero saber do DataFolha é o seguinte: quais foram os municípios pesquisados, quantas pessoas foram ouvidas por município, em que bairros moram e onde foram ouvidas. Esse é o dado, a relação mais importante de uma pesquisa - mas reparem que nunca é divulgado. Por quê?, pergunta o leitor perplexo...

Simples: imagine que você queira favorecer um determinado partido numa pesquisa. Você então irá escolher municípios governados por prefeitos desse partido e nos bairros onde eles tenham sido recentemente orientados a realizar alguma "obra social". Fácil, não? E tão, vamos dizer assim, isento, não? Tão limpo, clean... Com uma média de 25 por pessoa em cada município, dá de escolher a dedo...

E quem serão os 40 cariocas que nos representaram nessa pesquisa? Queria conhecê-los.... Devia ser engraçado reuní-los. Isso sim daria uma matéria... Você conhece algum pesquisado? Pois é, o pesquisado é o soldado desconhecido dos tempos de paz.

Pensando bem, se jornalismo já virou reality show, vamos fazer o seguinte: vamos pegar 12 pessoas em 150 municípios brasileiros e fazer um gigantesco Big Brother eleitoral! Vamos acompanhar a evolução do voto dessa gente ao longo dos próximos meses como se fosse uma novela... Será que o Serra vai conseguir seduzir a Marineide de Arapiraca? Será que o Lula vai mesmo ganhar a adesão do Coronel Altamirando de Aracaju? Será que alguém vai arrancar o voto da Bad Girl de Porto Alegre?

Ao menos ia ser mais verdadeiro do que essas pesquisas, essa rima pobre de canalhice com a burrice.