"É monstruoso...". Eu estava zapeando pelos
canais de tv quando cheguei a um programa sobre agricultura
em que um dos debatedores, aparentemente um economista ligado
a uma dessas instituições de empresários
agrícolas, dizia mais ou menos o seguinte: "...
a recessão econômica obrigou os agricultores
a procurar o mercado externo para escoar a produção".
Aparentemente nenhuma novidade, trata-se de uma dessas platitudes
repetidas com gosto por qualquer sujeito que tenha em casa
um terno e uma gravata.
Mas, naquele momento me soou como o koan que dispara a iluminação porque deu sentido à crise que, desde 1997, vem nos roubando emprego, renda e auto-estima. Concluí, numa espécie de satori geopolítico, que essa crise está sendo produzida e administrada deliberadamente para produzir excedentes de proteína e, desse modo, promover a expansão de outras economias, especialmente a chinesa.
Sim, a crise econômica, que tem como cerne a dívida
pública interna e externa que FHC e Lula só
fizeram e fazem multiplicar, é intencional e faz parte
de uma estratégia que está tirando proteína
do Brasil para colocá-la no prato ou no cocho alheios.
Soja, essencialmente. Em vez de nos ensinarem a comer soja,
fomos escalados, com a conivência desses genocidas botocudos
disfarçados de políticos, para morrer de fome.
Ou definhar.
Não é só o petróleo e a eletricidade
que são nossos. A soja também! E soja é
proteína. Mas ninguém diz que proteína
é energia também, mais importante até
do que petróleo e eletricidade porque gera força
muscular e inteligência.
O leitor me perdoe a introdução aqui de um
tema que a princípio ficaria melhor no primeiro caderno
do jornal comentado por gente mais competente, mas eu fiquei
perplexo. "É monstruoso...". Eu sou um leigo,
mas veja o leitor se não faz sentido o que digo...
Dívida, juros, câmbio e emissão são,
para mim, como modos ou nomes da mesma coisa - o dinheiro
- que vão sendo trocados no noticiário segundo
as necessidades dos "donos do dinheiro".
A dívida é um jogo meramente contábil,
baseado no trato absurdo em que o devedor concorda em nunca
saber o valor exato da sua dívida porque aceitou pagar
juros flutuantes que são calculados exatamente por
quem? Pelo detentor da dívida! Nem Samuel Beckett (ou
talvez apenas ele e Buñuel) poderia imaginar uma "máquina
perversa" tão perfeita.
Só não percebia uma intenção mais imediata e, ao mesmo tempo, mais profunda. Aparentemente, tudo seguia o curso de uma irracionalidade passional baseada na complexa equação dos humores de alguns megabacanas. O tal mercado, enfim... Nunca antes vira com tamanha nitidez a subordinação dessa "política econômica" a uma espécie de quase secreto planejamento global que hoje pode se dar ao luxo de dizer: "Se subirmos os juros no Brasil em dois pontos produzimos um desaquecimento da economia interna que pode representar uma oferta extra de soja no mercado", segundo pode constatar qualquer um que se dê ao trabalho de ler o livro "A roleta global".
Agora, leitor, vem o pior. Deixamos de comer e exportamos
a soja que deveríamos estar comendo. Essa soja é
vendida lá fora e remunerada em dólar. Esse
dólar que entra é trocado pelo governo por reais.
Os dólares, ao final, voltam lá pra fora principalmente
sob a forma de juros. Os reais que lhe são equivalentes
e estão concentrados nas mãos dos produtores
agrícolas vão para os bancos que, por sua vez,
os emprestam principalmente ao próprio governo sob
a forma de títulos remunerados por juros flutuantes
e aos consumidores a juros de agiota. Como todas as instâncias
de governo estão ocupadas por vigaristas e candidatos
a vigaristas (repetindo: todas!) é preciso mais impostos
para financiar a farra - e fechamos o ciclo que determina
nossa vida.
É um esqueminha tosco e cruel este meu, mas duvido
que esteja muito longe da verdade.
O mais doloroso é que os caciques globais aparentemente
decidiram que seremos nós os encarregados de alimentar
a expansão da China - e fim de papo: bye-bye, soja.
Aparentemente alguém em algum momento decidiu-se pela
China. E nós é que vamos pagar o pato laqueado
e o frango xadrez.
Estamos inaugurando uma forma de economia que não consta dos manuais e se pode ser chamada de "modelo agro-financeiro". Voltaremos a ser um grande fazendão feudal e nada democrático dos séculos passados. Nossa esquerdinha gramisciniana cuida de dar os últimos retoques na estrutura jurídica que prepara o advento do grande ditador. O fortalecimento dos governadores fará o resto. Os americanos sabem que melhor do que invadir o Brasil será dividi-lo.